segunda-feira, 30 de novembro de 2009


MANIFESTO SOLIDARISTA


“O Solidarismo é uma doutrina portadora de uma dinâmica tendente a projeta-lo em um movimento e a encarna-lo em um sistema. Como doutrina. O Solidarismo tem como categorias básicas a pessoa humana e acomunidade humana. A pessoa, como ser racional, livre, social é portadora de uma vocação a um destino transcendente ao mero processo histórico em que está envolvida e do qual participa como agente consciente. O Solidarismo não é uma doutrina imanentista. Mas não é também umadoutrina “evacionista”. Para ele, a pessoa humana realiza seu destino transcendente, como quer que ele seja concebido, pela sua fidelidade à vocação terrena, pela sua presença no momento histórico. Para ele, a pessoa humana, como ser racional, livre e social é sujeito de deveres e direitos, que decorrem de sua mesma natureza, independentemente de suacondição social, política, econômica, ideológica, étnica ou cultural. A pessoa humana tem direitos naturais à vida digna, à educação, ao trabalho, àliberdade, à propriedade. O Solidarismo entende estes direitos não como meras outorgas legais, mas como possibilidades concretas. Vale dizer que, segundo o Solidarismo, a pessoa humana tem direito às condições concretas e reais que lhe possibilitem viver dignamente, trazer à plenitude, pela educação, seus talentos diversificados, trabalhar honestamente, afirmar sem coerções seus desejos e opiniões, exercitar sua liberdade de opções, possuir, e, pela propriedade, realizar-se mais plenamente como ser humano.O Solidarismo sabe que as estruturas sociais vigentes não oferecem possibilidades reais para realização destes direitos. Por isso, ele é essencialmente um protesto que se traduz num programa de reformas. O Solidarismo não é mero moralismo. É reformismo radical. Radical, porque quer construir a reforma das estruturas a partir da raiz – a partir daconsciência. Assim, professa que a pessoa humana, além de direitos naturais, tem também deveres naturais. Deveres morais de consciência que se resumem nos deveres de justiça, de amor, de verdade, de lealdade, de solidariedade. Faltar a estes deveres não é para o Solidarismo apenas uma questão de infração passível de pena ou multa. É uma culpa moral, pela qual todo homem é responsável perante o tribunal incorruptível da consciência. Para um cristão, é um pecado, pelo que é responsável perante Deus. O reformismo solidarista como sistema se baseia na categoria da Comunidade. A reforma solidarista é uma reforma comunitária. O Solidarismo pretende deferir às comunidades reais, em todos os níveis em que se realizam, a hegemonia do processo histórico. Esta não pode caber nem ao Capital nem ao Estado, órgão de poder de um partido único. Os destinos políticos, conferidos às comunidades nacionais, estaduais emunicipais. O Solidarismo é nacionalista, estadualista e municipalista. Os destinos sociais e econômicos, deferidos às comunidades locais, às comunidades de vizinhança, às comunidades de trabalho, às comunidades de grupos. A grande ênfase do Solidarismo sobre a Comunidade se explica. A Comunidade é aquela realidade social da qual a pessoa humana participa na especificidade do seu ser, enquanto ser racional e livre. Como serracional e livre, o homem pensa o que quer. A Comunidade é o lugar natural onde os homens pensam e querem juntos. Projetam e decidem juntos em função do bem comum. Este é concebido precisamente como o conjunto de condições concretas nas quais e pelas quais cada pessoa humana pode realizar os seus direitos naturais, obedecendo a seus deveres naturais. Da comunidade o homem participa não pelo que tem, mas pelo que é. Acomunidade é a grande descoberta e a grande força do Solidarismo. Este é portador da certeza inabalável de que, à medida que as comunidades-reais assumirem em suas mãos os seus próprios destinos, através de seus representantes legítima e honestamente escolhidos, haverá de realizar-se numa democracia total, política, econômica e social. O Solidarismo não se constitui de negações, de anátemas. Sua Essência não é ser anticapitalista ou anticomunista. Tem uma consistência própria, uma mensagem própria.Ele é personalista e comunitário. Nesta sua mensagem reside a força de sua dinâmica e esta capaz de transformá-lo em movimento. Existem múltiplas forças solidaristas em marcha. Muitos movimentos que se encaminham obscuramente para um ideal solidarista. É tarefa do solidarismo, não tanto criar um movimento novo, quanto enfeixar, dar conteúdo e objetivo às forças solidaristas atuantes que se desconhecem. Deflagrado o movimento solidarista, nada poderá impedi-lo de criar estruturas comunitárias, que permitam a plena realização das pessoas humanas. O trabalho é árduo, mas sua chance histórica é poderosa, é irresistível, porque o Solidarismo é o ideal a que confusa e inconscientemente aspiram todos aqueles que anseiam por um Brasil realmente democrático e cristão.”
Pe. FERNANDO BASTOS DE ÁVILA, SJ Texto extraído do livro: SOLIDARISMO – Alternativa para a globalização. 2a. Edição. Junho, 2002. Editora Santuário.
OS GRANDES PRINCÍPIOS
1- A dignidade inalienável da pessoa humana, à luz da fé: criada por Deus, remida por Cristo, santificada e vocacionada pelo Espírito Santo. Dignidade que exclui qualquer discriminação racial, social, econômica, religiosa ou cultural. “O homem é o caminho da Igreja”, é a síntese mais densa do compromisso da Igreja com o homem, tema que encerra a encíclica “Centesimus Annus”. É o princípio que marca a distância entre a Doutrina Social da Igreja e todos os sistemas e ideologias de inspiração totalitária de direita ou de esquerda, para as quais a pessoa só recebe sentido do coletivo social do qual ela é apenas uma parte descartável.
2 — A primazia do bem comum. O princípio se bifurca em dois planos: o nacional e o mundial.
O bem comum nacional é a responsabilidade e a própria razão de ser o Estado que pode tudo aquilo e só aquilo que promove o bem comum, ou seja, o bem de todos, sem discriminações. Ele é precisamente o conjunto das condições concretas que permitam a todos atingir níveis de vida compatíveis com sua dignidade. A primazia do bem comum e a consagração da democracia como único regime político que preserva a dignidade da pessoa humana.
O bem comum em sua dimensão mundial é o bem da comunidade das nações (”Centesimus Annus” nº 52) confiado a uma autoridade supranacional e cujos sujeitos são precisamente os diversos países do mundo. Sua concretização e as condições de sua eficácia são ainda apenas esboçadas, nas grandes organizações supranacionais, sob a tutela da ONU, mas parece constituir o desfecho de uma evolução milenar, inscrita na própria natureza social do homem. O bem comum universal será o grande desafio do próximo milênio, para recuperar a implosão do 2º mundo e a marginalização do 3º mundo – (”Centesimus Annus”).
3- A primazia da destinação universal dos bens sobre a apropriação individual. Os bens criados se destinam a todos os homens. A apropriação individual, o chamado direito de propriedade, é uma forma eficaz de realizar melhor esta destinação. A propriedade, situada assim à luz deste princípio, é entendida como responsabilidade social e não como privilégio excludente: “Sobre toda a propriedade privada pesa uma hipoteca social” – (”Laborem Exercens”).
4 — A primazia do trabalho sobre o capital. O capital como forma de apropriação coletiva, pública ou privada, “só é legítimo na medida era que serve ao trabalho” (L.E.). O capital é o fruto do trabalho e a ele se destina. É o princípio que marca a incompatibilidade da Doutrina Social da Igreja com o capitalismo liberal. É importante relembrar o caráter fundamental desse princípio, num momento histórico no qual, com a implosão do socialismo real, um neoliberalismo, já denunciado por João Paulo II, na “Centesimus Annus”, se apresenta com a pretensão de ser a única opção, para uma humanidade sem alternativas.
5- O princípio da subsidiariedade. Segundo ele, as instâncias superiores de poder não se devem atribuir o desempenho daquilo que as instâncias inferiores podem melhor realizar. O dever das instâncias superiores é um dever supletivo, de coordenação e promoção da iniciativa e da criatividade das instâncias inferiores. É este princípio a fonte da vitalidade de um número imenso de instituições, movimentos e iniciativas que são a expressão da maturidade democrática liberta do paternalismo estatal. É também o princípio que oferece os critérios para discernir, na variedade das conjunturas, a solução de problemas tais como centralização e descentralização, naciona1ização e privatização.
6 — O princípio da solidariedade. É o princípio segundo o qual cada um cresce em valor e dignidade na medida em que investe suas capacidades e seu dinamismo na promoção do outro. O princípio vale analogicamente para todas as relações concretas: entre o homem e a mulher, os pais e os filhos, os grupos sociais, os níveis e setores de poder, o capital e o trabalho, o mundo desenvolvido e subdesenvolvido. Hoje se pode falar numa descoberta sempre mais lúcida de uma relação de solidariedade entre o homem e a natureza: o homem mais se valoriza na medida em que preserva e promove a natureza e esta, protegida e preservada, garante melhor qualidade de vida para o homem.

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